fotografia J.P.F
A vida não é sempre feliz. Os dias do agora pedem-nos uma felicidade constante, exuberante, contagiante e por aí fora. Mas a verdade é que nem sempre a felicidade tem lugar no nosso coração. Hoje uma mãe abraçou-me em lágrimas porque o filho morreu na idade de ainda fazer nascer sonhos, e não de os morrer. Dizia-me que o normal seria ela morrer e ele viver para falar das memórias dela, e não contrário. Eu só a consegui abraçar e pedir desculpa por não saber dizer nada perante tamanha dor. A mulher, no seu rosto de profundo luto, disse-me que não há nada para dizer, a vida tem de continuar, mas não sabe como. Não faço ideia da dor que é uma tal inversão do ciclo da vida, uma mãe órfã do filho único. Inexplicavelmente triste.
Vim embora, fazer a minha vida. Porque esta é a mais cruel das realidades. As pessoas que nos rodeiam adoecem, morrem, enviúvam, separam-se, perdem-se, e nós continuamos a nossa vida. Porque tem de ser. Porque é a nossa vida. E porque, em bom da verdade, a nossa vida pode continuar. Sorte a nossa. A morte é transformadora. Ainda não sei se para melhor. Quem nos morrer deixa em nós o lugar vazio, e esta é a pior resposta para a vida, para o diálogo, para o abraço, para o amor. Um lugar vazio de nada. Uma não resposta a qualquer pergunta. Fica-nos o que fomos quando éramos vidas antes da morte, fica-nos os momentos que agora serão todos diferentes, as datas de aniversário, as visitas, as gargalhadas, os vícios, os hábitos. Todos os momentos nos recordam quem foi, simplesmente foi. E tudo nos lembra a falta, e como seria diferente se ela ainda aqui estivesse, se ele ainda aqui me abraçasse. As fotografias resgatam os momentos antigos e temos raiva de não ser aquela fotografia que mantém aquela presença, tão perto da realidade que custa acreditar que já não é assim Viveremos para sempre com a ausência, e isto é uma dor cortante, escura, sombria, onde a luz tem muita vergonha de entrar.
Um abraço a todos a quem lhes morreu uma parte da vida.