quarta-feira, dezembro 04, 2013

FOME DE BACALHAU

Ora viva

Há dias, a propósito da recolha para o banco alimentar, uma jornalista perguntava a uma criança se sabia para quem era a comida…resposta? Para os pobres. Fiquei azedo, mas tão azedo. Vivo a vida com pessoas, muitas e de diferentes raças, sexo, profissões, estatutos, e antes de se me apresentarem como tal, são pessoas. Exatamente pessoas. Ainda que o ser “só” pessoa, para determinados indivíduos, possa ser coisa igual a toda a gente. Pessoa é o que são e serão. Com tudo aquilo que de mais físico e espiritual a pessoa tem!

Numa das reportagens que fiz esta semana, entreguei um cabaz de comida a uma instituição, não era oferta minha, e no cabaz vinha bacalhau. A diretora da casa chorou, chorou porque tinha 12 postas de bacalhau para dar a algumas das 1100 pessoas a quem ajuda contra a fome. E nunca lhe tinham dado bacalhau, e era uma festa ter aquelas 12 postas. Chorou por ver o bacalhau e eu chorei por dentro, porque tinha à minha frente uma mulher que criou uma IPSS há 10 anos, que vive da sua pensão de quase 300 euros e cujo sonho é fazer a sua cantina social.

Às vezes acho que anda tudo ao contrário. Os problemas que nos ralam a cabeça no dia-a-dia. A fome que milhões passam. O que eu não faço pelos outros. O que tanta gente faz pelos outros.
Gostava eu de ter palavras para agradecer a quem faz da vida a causa social, como voluntário ou profissionalizado. Quem trabalha para e pelos outros não fecha a porta do escritório e deixa lá os problemas. Quem trabalha nas casas sociais fecha a porta da instituição e traz no coração os problemas dos outros, quase sempre dos outros.


Nunca chamem a ninguém pobre. Nem rico. Nem doutor. Nem nada que não seja o nome próprio. Aquele que nos assina e nos lembra o berço de pessoas que somos e para sempre seremos.

até já

terça-feira, novembro 19, 2013

AGRICULTURA

Ora viva

Pés na terra. É das melhores sensações que posso dar à minha pele. Quando era miúdo lembro-me de andar descalço pelo campo de milho e adorar sentir a terra entre os deditos dos pés, e aquando de levar a água ao milheiro, era o deleite total, terra molhada e pé descalço. São memórias físicas que guardo da agricultura que os meus pais faziam. Em bom da verdade eu devia ajudar, mas passava mais tempo de cabeça na lua e de pés engolidos na terra, do que a dar uma mão ao cultivo. Mas sempre me fascinou a sementeira, a colheita, o pousio para os dias que hão-de vir. 

A agricultura é o melhor exemplo que podemos dar à vida, às coisas, ao amor, às emoções, à paciência, à perseverança. O agricultor é um vulcão de garra, de esperança e futuro. Semeia que Deus há-de ajudar, dizem os mais velhos. Na horta dos dias é a mesma coisa, semeamos na vontade de colher, e isto dá para tudo, para todos, por muito sábios e bem aperaltados que sejam. 

Cada um a seu jeito é um agricultor de palavras, projetos, construções, lições e sermões, curas e remédios, sorrisos e engenhos.

Curiosamente, nunca se falou tanto de futuro com uma arte de tão antigamente: a agricultura. Serena e paciente, ela vem sempre ter com a gente. É na terra que habitamos, e sem terra flutuamos. É por isso que gosto tanto de quem faz da vida a sementeira. É gente de esperança morena pelo sol. É gente de bem, é gente com raízes bem fundas, como convém a quem se planta nos campos que lavra.

abraços
Hélder

terça-feira, outubro 15, 2013

ARRUMAR O ARMÁRIO

Ora Viva

Este texto começou com uma arrumação da roupa de Verão, é… acho que acabou mesmo! Quantas vezes dizem a expressão: E se… ?! Para mim é uma frase terrível, sem exagero. A teoria dos “e se” é destrutiva. Castra a decisão no presente e gera-nos uma agonia no futuro, quando olhamos para o passado. 

Eu sou um homem ponderado, não entro nada na onda do Carpe diem. Para mim é uma quase treta. Claro que é ótimo viver intensamente o presente, mas sem a consequência do futuro? É como não acreditar nos sonhos, nos projetos, nas relações. Pois se eu vivo intensamente o agora, como se não houvesse o futuro, é dizer que tudo o que é plano não faz sentido. Não acham? Não há nada como viver o momento a ponderar o futuro. Um sem o outro é coisa estranha.


Voltando ao “E se…”, para mim é sinal de passado mal resolvido e medo do futuro. Pior que uma dúvida no presente, é uma dúvida no futuro sobre o passado. E se…nada. É preciso fazer de cabeça para a frente, ou não fazer de cabeça igualmente a direito. Não dar grande tempo à terrível dúvida que nos pode entorpecer. É claro que, como em tudo, esta regra não a cumpro a direito, mas dou-lhe poucas curvas. Ter, orgulhosamente, o passado arrumado em gavetas é ter uma casa com cada coisa no sítio certo. E há lá melhor sabor que um lugar arrumado?

Abraço
Hélder

terça-feira, outubro 08, 2013

GOSTAR



 Ora Viva

Hoje uma amiga disse-me que adora dizer às pessoas, quando assim se justifica, que gosta delas! Ora aqui está um bom tema de escrita. Gostar e dizer que se gosta. Para mim gostar é um exercício e uma generosidade. Um exercício porque para se gostar é preciso tempo e atenção. Tempo para ouvir, ver, perceber, abdicar de nós para entrarmos no mundo dos outros. Atenção para cumprir o grande desígnio de atender aos pormenores, às diferenças, às particularidades.

Eu não acho que se gosta porque se gosta. Nada disso. Gosta-se porque tivemos o cuidado de sairmos de nós, do conforto da nossa zona, para nos dispormos a entrar no fascinante mundo, que pode ser, o dos outros. Por tudo isto, tenho um profundo respeito e gratidão quando alguém diz que gosta de mim. Quero perceber os comos e porquês e depois agradecer a generosidade do sentimento.
Gostem-se muito! Tenho dito.

abraço
hélder

domingo, agosto 18, 2013

AS PALAVRAS

Ora Viva



Usamo-las abreviadas, gastas, novas, erradas e certas, na verdade e na mentira. Usamo-las de dia, à tarde e à noite. Entre silêncio e conversas. Na casa, na cama, no escritório, na rua, no telefone e no papel. As palavras.
Gosto tanto das palavras, dos seus contornos no papel. Do atrevimento de as usar. Da inquietação pelas novas e pelas do antigamente. A palavra, para mim, ainda é um poder, um saber, um amor perdido e achado numa frase que me faz parar. A palavra é um compromisso, uma missão, um segredo e um desejo. Coisa séria de se fazer. De se dizer. Mesmo que as palavras que agora dizes se amanhã forem mentira, que tenhas a ousadia de novas usar para dizer que estavas a enganar. Por isso as palavras serão sempre grandes. De heróis. De gente de mar e amor.
A palavra pode construir e destruir, tudo e nada, todos e só alguns. Tenho profundo respeito pela palavra. Pela honra. Pelo casamento que ela nos liga na união que é a conversa. Mesmo quando as uso para dizer que errei.

Gosto das palavras, até quando não as uso para dizer tudo o queria.

Fiquem muito bem!

terça-feira, julho 16, 2013

EU A NU

Ora Viva

Aqui vou eu...

O que me inspira? A luz da manhã. Uma noite de abraços. O cheiro do alecrim. Gosto de laranjas  frescas no Verão. Sou doido por água quando tenho sede, e adoro beber vinho sozinho. Gosto do cheiro   da terra molhada e de andar descalço, é quase um vício. Perco-me por casacos e por peixe fresco. Adoro a praia no Inverno e o sol de Março. 

Gosto de ruas com árvores e de olhar para o topo das árvores no céu. Gosto tanto do ombro da minha mãe e de quando o meu pai, em noites de frio, me puxava as meias para  cima. Gosto do branco e de canetas. Gosto de ouvir a gargalhada dos meus amigos. Adoro adivinhar o que levam as pessoas nos sacos das compras. Gosto de janelas de madeira. Adoro jarras transparentes. Gosto do cheiro dos livros novos e da madeira. Gosto de entrar em casa. Gosto do nome das pessoas.

Gosto que gostem de mim. Perco-me por batatas fritas. Gosto de dar. Gosto de receber. Adoro rasgar os   embrulhos. Gosto de lareira e de meias. Ahhhhh e queijo, sempre. Gosto das  coisas quando me apetecem. Gosto durante  muito tempo, por vezes o tempo todo, das pessoas que gosto há muito e daquelas que       comecei a gostar, gostarei sempre. Gosto de gostar, é isso, gosto muito de gostar.

Até.
Hélder

segunda-feira, julho 01, 2013

Caminhar















Ora viva

O que sentes quando caminhas? Quando tocas com os pés na terra? Quando usas sapatos novos para um dia especial? Caminho, caminho e caminho. Olhas para trás? Para o que os teus pés já fizeram? Às vezes o corpo anda e a alma fica parada, perdida num sítio cheio de casas e ruas chamadas por sentimentos.  E gostas de areia fresca
nos pés descalços numa noite de Verão? E andar para trás? Malditos caranguejos que nos ensinaram a andar para todos os lados, e para mim o caminho deve ser em frente, à procura do destino, se destino houver.

E quando tropeçamos? Confesso, acho um certa piada às quedas, às minhas também, fico sempre com a ideia de que toda a gente na rua está a olhar para mim...e rio-me, assim não haja dor no corpo. Atarantados para evitar cair, ... é também assim na vida. E por vezes tem piada.

E com que pés caminha a nossa alma? Serão de sede? De medo? De determinação? De vento? De espuma do mar? De veludo? Ou de ver onde isto vai dar?

Pés no chão, cabeça no ar!

Abraços

Hélder


quarta-feira, maio 01, 2013

Amar nas coisas pequenas


Ora Viva

Amar nas coisas pequenas. Não sei conhece a canção da Madredeus, Coisas Pequenas. Ouça, por favor. Partindo do princípio que já ouviu, pergunto -lhe o que achas das coisas pequenas no amor? Os detalhes de uma relação, o cuidado, a capacidade de reparar, parar, olhar e abrir as portas do sítio do coração. O mundo é feito da aparência das grandes coisas. Grandes carreiras, grandes empregos, grandes sonhos, grandes marcas, grandes livros, grandes viagens, carros, discursos, conhecimentos...E quem não tiver algo grande, ou é um infeliz, ou não é ninguém, para alguns, claro. E os que amam e se alegram com as coisas pequenas da vida. 

Aqueles para quem viver é ter para viver e não viver para ter, os que escolhem dar mais do que receber? Os que gostam de parar para ouvir as gargalhadas dos outros e se sentam a olhar o que oamorr faz da vida? E dar coisas pequenas? Aquelas que na fragilidade do seu preço ou valor bolsista, arrebitam o engenho da criatividade e aguçam o desafio do material? É...o mundo pode ser maravilhoso nas coisas pequenas, e nestas estão as coisas do amor, que para muitos é tudo o que a vida tem, e "tudo aquilo que eu quero dar". 

E um grande amor...poderá ser uma coisa pequena? Claro que não, por isso, diz a canção: Coisas pequenas são coisas pequenas...que dizem que eu te quero amar". Neste mundo que nos come a alma, quem ama nas coisas pequenas consegue o maior lugar para um grande amor;tenho dito.

Até já! E ouçam a canção dos Madredeus!!

Hélder

segunda-feira, abril 01, 2013

GOSTO DE ANÓNIMOS


Ora Viva

Sou apresentador de televisão há 10 anos. Já percorri o país inteiro, ilhas inteiras. Diariamente! Por semana entrevisto dezenas de pessoas, geralmente anónimas, extraordinárias. Tanta gente que no peso do anonimato, porque ao ser-se figura pública tem-se uma vida mais leve em muita coisa, faz tanto por um mundo que é constantemente melhor e não sabemos por mão de quem…eu sei, graças aos anónimos, que fazem, dão, lutam, perdoam, inventam, recriam-se, e voltam a dar. Sem fotografias ou capas de jornais. O retorno? Muitas vezes é essencialmente o bem comum. Não sou um homem muito dado ao social, ao glamour, reconheço. Mas sou um homem dado a gente que faz das tripas coração para levar a vida para a frente, e ou vai ou racha. Quanto mais conheço esta gente que a maioria dos portugueses ignora e eu tenho o privilégio de entrevistar, mais me fascino pelas pessoas que não têm exposição pública. São porque são, fazem porque fazem! Gente valente e brava. Amanhã, talvez, entrevisto-o a si, que me está a ler! Quem sabe…terei essa sorte!

Hélder Reis

domingo, fevereiro 17, 2013

Fim do dia

Ora viva

Quando o dia termina, olho para o princípio... e avalio. Geralmente aquilo que fiz, a quantidade, depois a qualidade, e por fim o que não devia ter feito.

Hoje. Acaba o dia e sinto que não fiz nada. Dormi. Muito. Não gosto de dormir, amuo ao ir para a cama. Mas preciso de dormir e não vale a pena muita história. Mas a verdade é que não fiz nada. Não li, não observei, não escrevi. Nada.

Apesar deste nada, a vida continua a sua ordem natural de afazeres. A noite vem, o dia vai, o vento marca presença, a chuva dá o seu ar de graça, ou desgraça, a respiração toca o compasso. Tudo anda, menos eu. Perdi um dia e nada. Nem dei nada ao mundo, nem deixei que o mundo me desse nada. Caramba, isto não pode voltar a acontecer. A não ser que o próximo domingo seja de chuva e vento... Lá está...vou cair no mesmo. Ou não!

Abraços

Hélder


quarta-feira, fevereiro 13, 2013

Preparativos

Ora Viva

Sempre gostei do antes. Antes das férias, fazer a mala, preparar os bilhetes, escolher a roupa e definir roteiros. Antes de me deitar, a agenda do dia seguinte, a preparação do trabalho, o arrumar as ideias e saber que tenho um novo dia para recomeçar. Sabe bem a preparação.

Mas das preparações que mais gosto, aquela que é Aquela, é o tempo que antecede a primavera, aquele mês antes, está quase... Março até pode ser ainda frio e com gripe, mas já é primavera. Preparo os vasos para receber as novas plantas, as árvores vestem-se de roupa nova, e eu preparo a roupa fresca de sabor a mar e esplanadas. Antecipo um tempo onde a força do nascer me inspira profundamente.

Quando era miúdo dizia que gostava de ser uma árvore, deve ser daqui que vem esta paixão pela estação que anuncia bons dias de luz!


Abraços

Hélder